O skate vem demonstrando que sua força é algo fora do comum, e para algumas pessoas isso é um motivo de superação em suas vidas, servindo de exemplos para todos nós. Desta vez a realidade vem do Brasil, confiram a reportagem publicada pela revista brasileira Cemporcentoskate.
Confiante
de que os limites do ser humano são estabelecidos pela mente, e não
pelo corpo, Fernando Cobra optou por vencer mais desafios do que sua
condição física parecia permitir. Conheça um pouco da história
de um skatista como você.
"Deficiente é aquele que não
consegue modificar sua vida, aceitando as imposições de outras
pessoas ou da sociedade em que vive, sem ter consciência de que é
dono do seu destino" (Mario Quintana)
Uma
viagem para a Califórnia. No caminho, 20 pistas devidamente
identificadas e mapeadas num roteiro pouco usual para um casal em lua
de mel. Foi assim que Fernando Cobra e sua esposa Angélica
comemoraram sua união, ocorrida em 2007. Cruzando todo o estado
norteamericano, e contando com os registros em foto e vídeo da
esposa, Fernando realizou seu sonho, não por acaso o de dez entre
dez skatistas.
“Vejo muita gente que tem objetivos, da boca pra
fora. Você só consegue o que quer se vier do seu coração. E as
minhas vontades vêm do coração”, afirma.
Por
razões que a medicina jamais soube precisar absolutamente, Cobra
nasceu sem a perna direita (do joelho para baixo). Reflexo de um
parto bastante complicado, as cerca de 48h que sua mãe foi obrigada
a esperar pela notícia do filho a fizeram ver o problema como uma
coisa menor.
“Minha mãe achava que eu tinha morrido. Quando soube
que ‘só’ faltava meia perna, ela ficou aliviada.” Segundo ele,
“a maneira com que minha família lidou com a situação foi
fundamental. Aprendi a engatinhar já com uma prótese, nunca ninguém
ficou me tratando diferente, ou facilitando as coisas pra mim”.
Desde
que começou a ter noção de sua limitação física, jamais
imaginou que isso poderia ser um empecilho para qualquer um de seus
objetivos. Talvez uma dificuldade, uma adaptação a mais, mas nada
que o impossibilitasse. Prova viva de sua própria determinação,
Cobra praticou triatlo durante muitos anos, sendo o responsável pela
criação (por parte da confederação que regulamenta esta prática)
da categoria “amputados”, algo que julga essencial que exista em
todas as atividades.
“O deficiente, não só praticante, mas também
simpatizante do esporte, sente-se incluído ao saber que determinada
competição terá uma categoria para ele”, defende. A disciplina
necessária para competir como triatleta não se encaixava mais na
agenda de Cobra, que teve que abandonar o triatlo competitivo.
O
destaque obtido, além dos cerca de quinze troféus, infelizmente,
não gerava condições de sustentar-se pelo esporte. “No dia da
competição, diretores de empresas me abraçavam, me davam os
parabéns, pediam para eu visitá-los.
Na segunda-feira, quando
chegava nas empresas, pareciam outras pessoas: me atendiam mal,
ofereciam duas camisetas e ainda queriam que eu participasse de
jantares, eventos que nada tinham a ver com esporte.”
Estava aberto
o caminho para a retomada de uma outra paixão, com horários
flexíveis e regras quase inexistentes: o skate. “Comecei com o
Torlay, com seis ou sete anos”, recorda. Mais tarde, conheceu as
curvas do banks do QG Skatepark, em Pinheiros, e a ladeira da
Circular do Bosque, no Morumbi.
“Nessa época, usava uma prótese
que restringia muito o movimento”, explica.
A evolução
tecnológica dos materiais usados na fabricação da perna mecânica
propiciam hoje um skate ilimitado e, consequentemente, muito mais
divertido.
Os banks das pistas públicas da Imigrantes e do Sumaré,
ambas na capital paulista, têm sido o terreno preferido de Cobra,
além do clube Pinheiros. “O dia que subi no tapume pra ver qual
era a nova obra no clube e descobri que estavam fazendo um banks,
fiquei alucinado.
A partir daí, o skate voltou com tudo a fazer
parte de minha vida.” Cobra, inquieto assumido, trabalha no mercado
de derivativos e futuros, a BM&F. No ritmo alucinante do mercado
financeiro, muitas vezes se pega almoçando diante do computador, de
olho numa oportunidade de negócio que simplesmente não vai esperar.
“Amo isso” afirma Cobra – “preciso dessa adrenalina, dessa
concentração absoluta”. Um dos benefícios de ser meio homem,
meio máquina é a mistura entre preparação física e manutenção.
“Às vezes, volto da sessão com alguma avaria na perna mecânica.
No dia seguinte, chego ao trabalho, mando pelo motoboy para o
conserto e, no final do dia, me trazem ela de volta, novinha!”.